
O governo dos Estados Unidos endureceu as regras para quem tenta cruzar a fronteira e anunciou um novo processo de deportação rápida. Em resposta, entidades que atuam com a comunidade brasileira no país intensificaram a pressão sobre o governo Lula, cobrando ações imediatas e o fortalecimento da rede consular.
Em uma coletiva realizada nesta quarta-feira (11), em Boston, representantes de organizações da diáspora brasileira anunciaram o envio de uma carta oficial ao governo federal. O documento exige providências diante do aumento exponencial na demanda por serviços consulares, que hoje se mostram incapazes de atender aos imigrantes. Em alguns consulados, há até 5 mil pedidos pendentes de certidões de nascimento e cerca de 20 mil solicitações de passaportes.
Essa é a primeira mobilização coordenada de brasileiros no exterior desde o governo de Donald Trump. Segundo as entidades, as prisões de brasileiros nos EUA aumentaram 400% desde janeiro. Só entre abril e maio, o salto foi de 50%, embora os números absolutos não tenham sido divulgados.
Entre as principais reivindicações estão:
A ampliação da capacidade dos consulados brasileiros para emissão de documentos;
A criação de canais permanentes de comunicação com postos diplomáticos;
A realização de uma audiência pública na Câmara dos Deputados com participação da sociedade civil;
A atuação conjunta com o governo dos EUA para garantir a aplicação de convenções contra tortura e maus-tratos.
As organizações denunciam diversas violações de direitos humanos envolvendo deportações e detenções arbitrárias de brasileiros.
Álvaro Lima, fundador do Instituto Diáspora Brasileira e funcionário da prefeitura de Boston, ressaltou a importância da comunidade para a economia americana. Segundo ele, empresários brasileiros geram cerca de 82 mil empregos diretos e indiretos nos EUA. “Hoje somos caçados como animais. Mas não somos animais. Somos seres humanos. Precisamos agir e precisamos do apoio do nosso governo”, afirmou.
A deputada estadual Priscila Souza, brasileira eleita em Massachusetts, também saiu em defesa da comunidade. Ela lembrou que imigrantes fazem parte da história americana e criticou o silêncio de políticos locais diante das violações. “Até mesmo deputados republicanos ficaram constrangidos. Não imaginavam que a repressão seria tão grave”, afirmou.
Durante a coletiva, relatos de abusos se multiplicaram. Lenita Reason, diretora do Brazilian Worker Center, disse que muitos brasileiros vivem com medo de sair de casa. “Pessoas estão sendo presas e mantidas por mais de 12 horas dentro de carros antes de serem levadas a uma prisão”, denunciou. Ela reforçou o apelo por mais recursos para os consulados, que, segundo ela, enfrentam um aumento de 400% na demanda. “Temos famílias que querem voltar ao Brasil, mas não conseguem porque não têm documentos”, lamentou.
Renata Bozzetto, da Florida Immigrant Coalition, relatou que abordagens policiais estão se tornando frequentes e abusivas. “Carros são parados por motivos banais e os motoristas acabam presos por estarem em situação migratória irregular”, contou. Segundo ela, até quem procura órgãos oficiais para regularizar sua situação é detido imediatamente, sem direito sequer de se despedir dos filhos. “Isso é desumano”, afirmou.
Patrick Garcia, da Carolina do Norte, pediu sensibilidade dos consulados para não julgarem quem busca ajuda para retornar ao Brasil. “O medo é real. Se a família decide voltar, é preciso respeitar”, disse. Ele relatou o caso de um imigrante que esperou meses por apoio para retornar ao país de origem.
O advogado Antonio Massa denunciou que nem o direito ao habeas corpus tem sido respeitado. Segundo ele, as autoridades americanas têm cotas diárias de prisões e precisam deter cerca de 3 mil pessoas por dia. “Há clientes que foram mantidos em salas sem nem mesmo espaço para sentar no chão”, relatou.
Outro caso citado envolveu agentes de imigração atuando nas proximidades de uma igreja em plena manhã de domingo, o que foi descrito como uma “campanha de terror”. A repressão crescente também tem gerado um novo fenômeno: o desaparecimento de brasileiros de restaurantes e comércios mantidos por imigrantes, ameaçando a sobrevivência desses estabelecimentos. Em algumas cidades, o movimento caiu pela metade.
A carta enviada ao governo brasileiro também alerta para casos de tortura e até de crianças sendo algemadas.
Fila nos consulados e respostas do governo brasileiro
Nos últimos dias, o governo Lula anunciou que pretende reforçar a assistência aos brasileiros no exterior, especialmente na emissão de certidões de nascimento e passaportes. No entanto, como revelou o UOL, a falta de pessoal nos consulados tem gerado filas enormes. A comunidade teme ser separada dos filhos caso sejam deportados sem documentação regularizada.
Desde o início das medidas migratórias mais duras sob o governo Trump, o consulado em Boston, por exemplo, registrou um aumento de sete vezes na procura por serviços emergenciais em comparação a 2024.
Apesar das promessas do Itamaraty, líderes da comunidade brasileira afirmam que as ações continuam insuficientes. A carta de denúncia é assinada por diversas entidades, incluindo o Brazilian Worker Center, Grupo Mulher Brasileira, Instituto Diáspora Brasil, Defend Democracy Brazil, Florida Immigrant Coalition, deputados brasileiros em Massachusetts, entre outros.
Estima-se que mais de 2 milhões de brasileiros vivam atualmente nos Estados Unidos. Cerca de 57% deles estariam em situação migratória vulnerável — com visto temporário, residência pendente ou sem status legal.
Liana Costa, ativista em defesa da comunidade, defendeu que o governo brasileiro busque meios de validar documentos de forma remota. “Os consulados precisam ser socorridos com urgência”, afirmou.

UOL
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